Exemplificando o Amor
Era noite alta quando uma caravana de espíritos afins saiu
do conforto de seus lares na colônia onde viviam para ir ao encontro dos
sofredores das regiões obscuras da Terra. O ar pesado, o frio, o calor, as
dificuldades da caminhada.
O objetivo era encontrar dois irmãos de Alfredo, um de
nossos companheiros mais prestimosos, com uma folha de serviço imensa perante a
humanidade, apesar de ser um daqueles cristãos, verdadeiramente anônimos.
Antes disso, o próprio Alfredo em conversa conosco aventou
esta possibilidade. Não se sentia com méritos suficientes para obter esta
dádiva.
- É claro que tu tens todos os méritos meu caro amigo! –
disse eu.
- Não vejo assim. Ainda preciso fazer muito mais pelos
outros.
- Mais? Tu mesmo não sacrificaste tua vida, tua saúde, teu
descanso, tua juventude em favor dos próprios irmãos de quem falas e de outros
tantos de humanidade em tua última existência? Aliás, pelo que me consta, nas
tuas últimas tens te sacrificado sempre.
- Não é mais do que obrigação pelo tanto que tenho
recebido de Deus! Não vejo méritos e sim deveres.
- Já sei quem poderá então ratificar com todas as letras
os teus méritos perante a vida eterna. Mas antes de tudo, quero que saibas que
estarei ao teu lado!
- Obrigado! Mas de quem falas?
- Bezerra, o nosso querido médico.
- Não Efésio... Não posso incomodá-lo. Ele tem tanto o que
fazer.
- Sim, mas isso não significa que não poderá ratificar ao
menos o que digo. Hoje mesmo estarei com ele para traçar algumas diretrizes de
trabalho em favor dos sofredores das regiões mais obscuras.
- Você fará mesmo isso por mim?
- Claro! Além de ser uma alegria para mim servir a ti, meu
amigo. É algo que também se torna um dever. Pois quem pode deve realizar!
Assim, mais tarde estivemos com o nosso querido mentor que
além de estar ciente de nossas intenções ainda arrematou:
- É claro meu querido Efésio. Nosso amigo Alfredo é grande
merecedor desta oportunidade por tudo que fez pelos pobres do mundo, pelos
desventurados e infelizes da sorte. Acima disto, esta ação já estava em nosso
planejamento e no mais tardar amanhã, estaremos visitando aquela região com uma
equipe de mais de uma centena de amigos que farão o mesmo trabalho particular,
que ao somar a ação de todos se tornará numa ação coletiva que trará grandes
benefícios a dezenas de irmãos em condições semelhantes. Não percamos tempo!
Efésio, leve Alfredo até o setor de planejamento de resgates, seção três que lá
estudaremos a melhor maneira de agir.
- Obrigado... – disse Alfredo já em lágrimas quase a
ajoelhar diante do Dr. Bezerra, o que este não permitiu em sua humildade.
- Não me agradeça Alfredo, agradeça a Deus!
Horas depois, com tudo planejado nos reunimos aos demais
irmãos que tinham semelhantes objetivos. Bezerra, ao lado de mais dois irmãos
experientes nestas atividades em regiões obscuras nos recebeu com muito carinho
e como se falasse ao coração de cada um nos incentivou a nos doar ao máximo com
amor e abnegação.
Partimos e ao entrar na região específica, fomos nos
separando em pequenos grupos, de acordo com o planejamento. Em quatro horas
deveríamos retornar ao mesmo local, independente do êxito ou não da tarefa. Era
nosso compromisso.
Seguimos em frente, agora em número de cinco companheiros
a fim de tentar encontrar e resgatar os dois irmãos de Alfedro... A paisagem não
diferia muito das que já foram relatadas em diversas obras espiritualistas.
Terreno irregular, vegetação pobre e escura, água escassa e geralmente suja...
Escuridão e diversas entidades sofredoras e outras ameaçadoras... Grutas,
cavernas e passagens estranhas, pontes estreitas, precipícios, montanhas
terríficas e vales sombrios.
Segundo as informações passadas por Alfredo, os seus
irmãos estavam ao pé de uma destas montanhas sombrias, não longe de onde já
havíamos chegado. Contudo, deveríamos tomar cuidado com vários aspectos,
inclusive onde pisávamos. Aquela região era controlada por espíritos que
sugavam as energias daqueles irmãos em desdita. Como possuíam a consciência pesada pelos
diversos crimes praticados na Terra, acreditavam que não tinham o direito de
sair dali. Os que controlavam aquele local atuavam como juízes e ao mesmo tempo
capatazes vigiando vinte e quatro horas, caso pudéssemos mensurar as horas por
ali... Eles se revezavam em todo aquele vale. Diziam-se justiceiros de Deus!
Mas não passavam de espíritos cheios de culpas, com muito ódio e vontade de
subjugar os outros numa falsa justiça da qual se diziam merecedores de o
fazerem.
Necessitávamos quebrar as armadilhas psíquicas e distrair
os vigias de onde estavam os dois irmãos de Alfredo. Ambrósio, um dos
companheiros se dispôs a densificar seu corpo perispiritual para chamar a
atenção dos vigias, enquanto nós poderíamos seguir em frente.
Foi o que aconteceu. Ele apareceu como um “fantasma” a
frente de um vigia do vale, um justiceiro e juiz simultaneamente.
- Quem é você? – disse assustado e raivoso, quase a atacar
nosso companheiro.
- Sou um amigo.
- Não tenho amigos! Fora daqui!
- Tudo bem, irei...
- Aliás, nada disso! Agora ficará preso! Permaneça onde
está! – disse o soldado ordenando.
Ambrósio retrucou perspicaz e sereno:
- Ora meu amigo. Decida-se... Devo ir ou ficar?
Enquanto ele distraía o vigia, passamos despercebidos e
avançamos rápido. Algumas centenas de metros a frente encontramos uma pequena
gruta. Deveria ser ali o local onde estavam os dois irmãos.
Quando chegamos encontramos dois seres ligados um ao outro
pelo ventre... Além disso, estavam sujos e desnorteados, quase totalmente
desfigurados. Os dois se insultavam e logo depois choravam juntos. O estado
mental que apresentavam era muito doído de se ver...
Alfredo se aproximou emocionado. Sabia que eles teriam
muito que recuperar. Já estavam quase prontos para sair dali, mas necessitavam
cooperar, caso contrário, de nada adiantaria retirá-los daquele lugar, pois
logo retornariam. Precisavam se perdoar e querer mudar.
Ele se aproximou dos irmãos que temeram ser um dos
capatazes.
- Ai meu Deus... Vamos apanhar de novo...
- Não aguento mais!
Disseram quase chorando...
- A culpa disso tudo é sua!
- Não! É sua! Você deu a ideia!
- E você bem que gostou! Planejou tudo!
- Já você aceitou!
- Pobre Alfredo... Morreu na sarjeta, pobre, como um
vagabundo e ladrão por sua culpa irmão.
- Sua também!
- Cale a boca!
- Cale você!
E começaram a se debater e bater um no outro... Enquanto
isso Alfredo rezava pelos irmãos. Era admirável! Ainda mais que nenhum de nós
sabíamos a história particular do amigo com os irmãos. Ali, naquele momento
soubemos que ele havia sido traído pelos dois que armaram um plano para jogá-lo
na sarjeta e ainda acusá-lo como ladrão perante a justiça... Foi traído pela
própria família e mesmo assim estava ali, para perdoar... Ou melhor, para
auxiliar, pois não sentia raiva, ódio ou qualquer mágoa dos entes.
- Obrigado meu Pai! – disse ajoelhando a frente dos
irmãos, estendendo os braços em direção aos dois como se estivesse
magnetizando-os e transmitindo vibrações positivas. Na verdade estava
realizando um processo magnético para clarificar a mente dos irmãos a fim de
que tivessem condições de realizar as reflexões necessárias para dali terem
condições de sair – Obrigado por ter meus dois irmãos de coração novamente a
minha frente. Estou aqui para auxiliá-los, mas peço que clareie seus corações a
fim de realizarem as reflexões necessárias para os retirarmos daqui e recomeçar
o aprendizado! Faço aqui, desde já o compromisso por ser o condutor de seu re-erguimento
moral. Caso preciso for, voltarei a Terra com a missão de educá-los e
encaminhá-los no caminho do bem e do amor!
Enquanto orava, os dois irmãos foram se acalmando e
começaram a lembrar da figura de Alfredo. Aos poucos relembraram a bondade que
o irmão traído sempre os tratara e se arrependeram sinceramente do que
realizaram. Queriam de coração a oportunidade de pedirem perdão ao irmão há tanto
tempo esquecido e menosprezado pela ambição do dinheiro fácil de uma herança
familiar...
Aos poucos, aquele homem que enxergavam à sua frente foi
se transformando e finalmente, após confessarem os crimes e pedirem a chance
para que Deus os permitisse pedir o perdão, conseguiram identificar o indivíduo
como o irmão traído na última existência. Dali em diante o que se viu foi uma
comovente cena. Alfredo se ajoelhou à frente dos dois estendendo os braços na
direção destes que ficaram sem saber o que fazer.
- Não vão me dar o prazer de um abraço? Depois de tanto
tempo sem tê-los ao meu lado!
Foi Genésio que respondeu.
- Não pode ser... Alfredo? Ou será mais uma armadilha
daqueles...
- Por favor, esqueçam a revolta e o ódio. Olhem bem em
meus olhos. Sou eu mesmo. Não me reconhecem?
- Sim! É ele mesmo!
Em seguida os dois irmãos “colados” um ao outro desataram
a chorar e soluçar tentando pedir perdão a Alfredo. Era realmente uma cena comovente!
Enquanto eles choravam e tentavam se desculpar, nosso amigo os abraçava e
beijava as mãos, os rostos macilentos e sujos e também pedia perdão por
deixá-los tanto tempo ali. Aproximei-me depois de um tempo decorrido e alertei
Alfredo sobre a necessidade de irmos, mas para isso ainda faltava equilibrar um
pouco as emoções dele e dos irmãos. Alfredo orientou esses a orarem.
- Orar? – ficou sem saber o que falar Bernardo.
- Sim. Acompanhem-me na oração dominical que nossa mãe nos
ensinou quando pequenos!
E de mãos dadas, sentados naquele chão imundo os três
oraram com fervor. Enquanto isso, nós que os acompanhávamos emocionados nos
oferecemos para realizar um passe dispersivo e posteriormente com o intuito de
magnetizá-los com energias equilibrantes e fortalecedoras de seus ânimos
combalidos.
Ao findar a prece, colocamos os dois numa espécie de maca
um pouco mais larga que o comum e rapidamente nos dirigimos à saída, afinal
faltavam poucos minutos para o prazo daquela atividade ali se encerrar.
Quando estávamos já na saída vimos Ambrósio consolando o
vigia que estava sendo distraído por ele. Na verdade, nosso amigo experiente
conseguiu fazer com que o vigia também pudesse refletir sobre seus atos e mudar
de ideia e disposição, sendo levado também juntamente com os irmãos de Alfredo.
Ainda tivemos alguns percalços naturais, emocionais e
outras tensões no retorno. Tivemos que pedir auxílio aos guardiões para que
nossos resgatados não fossem “recuperados” ou prejudicados com vibrações
rebeldes. Ao sair do raio de ação daquela comunidade justiceira, nos
encontramos com as demais equipes e com nosso querido Bezerra.
Amparando um ao outro e principalmente os resgatados
rumamos de volta à cidade espiritual em que fazemos morada. Lá direcionamos os
resgatados aos locais apropriados para sua recuperação. Hospitais e casas de
repouso e ensino.
Alfredo acompanhou os irmãos, instalou-os e após eles
receberem os primeiros atendimentos e breves orientações sendo induzidos ao
sono reparador, veio ter conosco para agradecer a oportunidade do resgate dos
irmãos queridos!
- Não tem porque agradecer, meu amigo! Fiz muito pouco
para qualquer agradecimento... – falei.
- Para mim fez tudo! Obrigado!
- E agora?
- Agora vou acompanhá-los. Eles precisarão passar por
algumas cirurgias reparadoras de seus perispíritos. No entanto, necessitam
primeiro se aceitarem, perdoarem-se e quererem mudar após esta “explosão” de
emoções. Senão...
- Senão?
- Eles poderão renascer no mundo assim... “Grudados” um ao
outro e compartilhando algum órgão vital que impede a separação. Infelizmente
eles ainda se odeiam muito, apesar de terem pedido perdão a mim, mesmo que eu
não tenha nenhuma mágoa ou sentimento contrário a eles, pelo contrário! Apenas
amor sincero!
- Espero que consigam!
- Também espero, mas se não conseguirem melhorar, estarei
disposto a voltar e recebê-los em meu ventre como filhos!
Confesso que fiquei emocionadíssimo, admirando nosso amigo
Alfredo. Foi realmente o que aconteceu. Ele se dispôs a voltar com envoltório
feminino e hoje luta na Terra com seus filhos gêmeos xifópagos que compartilham
alguns órgãos, inclusive o coração e terão que viver assim até o fim dos dias.
Sempre que relembro do exemplo de nosso amigo me encho de
esperanças e fico emocionado em saber que a humanidade possui muitos heróis e
heroínas anônimos! É disto que precisamos! Heróis que não dão tiros, matam ou
seguem a risca o “olho por olho, dente por dente”, mas que perdoam, amam
verdadeiramente sacrificando-se em favor do próximo!
Deus nos abençoe! Efésio, o humílimo servidor do Pai –
20.12.13, psicografado por Jerônimo Marques.
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