Pintor do Bem

 

Pintor do Bem

Era uma criança a amarrar os cadarços de seu sapato. Ainda que pequena, já conseguia com certa dificuldade, dar voltas naqueles cadarços com certa perfeição, embora com ritmo lento, o suficiente para alguém se impacientar, caso estivesse com pressa...

Para o pintor que observava o menino, aquilo era um prato cheio às suas asas de artista que buscava sempre retratar o mundo à sua volta. O mundo real, mundo simples do cotidiano.

Ainda que não precisasse e nem gostasse de ter um modelo para desenhar e pintar, preferia apenas gravar na mente certa cena que o interessasse e assim reproduzir o que lhe viesse com tal inspiração.

Chegou em sua casa e em seu ateliê improvisado, e foi direto para uma tela ainda em branco. Traçara alguns traços ainda indefiníveis... Aos poucos o menino quase agachado aparecia segurando um ponto de laço em cada mão. Seu rosto concentrado, transmitia não preocupação, mas afinco, determinação para terminar aquela tarefa com disciplina e simplicidade de forma simultânea.

À sua volta desenhou um ambiente de uma praça bem arborizada alguns outros estudantes como o próprio menino que caminhavam talvez em direção à escola, ou de volta para casa... Uma luz solar que não se definia muito, pois parecia estar nublado, exceto sobre o menino que demonstrava, talvez, dar um pequeno e discretíssimo sorriso de cantos de lábios, por ter a certeza de que conseguiria terminar seu laço. A pasta de estudante ao lado não deixava dúvidas para ninguém de que ele ainda estava estudando nos primeiros anos de ensino.

Cada detalhe ali era impressionante. A pintura parecia ser de um mestre, embora o pintor ainda fosse jovem, com menos de duas décadas de existência.

O quadro, quando terminado ficou belíssimo. O autor sentiu-se levíssimo! Deu o nome à obra de “O vencedor e seu laço”. Embora fosse jovem, vendeu o quadro a um senhor rico que gostava de obras de artes de artistas não muito conhecidos... Desde que a obra lhe agradasse e o harmonizasse.

Com o dinheiro, nosso amigo comprou alguns alimentos, roupas e algumas luvas e calçados para o Natal. Mas não foi para ele... E sim para uma família pobre que ele conhecera há alguns dias. Tocara-lhe profundamente o drama de ver o pai de cama, a mãe com três filhos pequenos e sem ter como trabalhar para trazer comida para o lar.

Ele mesmo que trabalhava numa empresa de construção náutica, quisera comprar tudo apenas com o seu salário de alguém que acabava de iniciar no emprego. O pouco que lhe sobrava das contas pagas, era direcionado sempre para alguém mais necessitado. Só que muitas vezes não era o suficiente, então, ele utilizava seu talento artístico para pintar algo a fim de quem sabe ajudar alguém.

Não era a primeira vez que nosso querido amigo fizera aquilo. Feliz estava, e lá foi ele para entregar o pão conquistado. Ao chegar no lar humilde foi recebido como um rei, embora a simplicidade do local e da família. Estava conquistando amigos que outrora foram até inimigos.

Gostou tanto do que fizera daquela vez, daquele jeito, que passara a repetir sempre a dose. Trabalhava num quadro de uma cena que lhe agradava e o vendia. A renda era convertida em alimentos, roupas, calçados, materiais para reforma ou construção de lares, e tudo quanto é tipo de dificuldade financeira.

Fez assim no restante de sua breve existência. Vivera apenas trinta e cinco anos! Mas soube aproveitar bem o tempo! Fez o seu melhor! Não se tornou conhecido, mas poderia ter sido... Pintava muito bem! Mas pintava melhor a solidariedade, o auxílio gratuito, a humildade!

Passou a vida ajudando, quando poderia esperar reconhecimento. Usou a arte como meio de auxílio e não de autopromoção! A arte era o seu trabalho para burilar o bem que deveria fazer e não uma arte por fazer e enriquecer o bolso, mas empobrecer o espírito!

Jesair e amiGOS 

 

 

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