Depoimento: Era de Nada

Quando um pequeno sentimento foi invadindo o meu coração, achei melhor deixá-lo pra lá... Afinal, aquilo não era nada... Esse sentimento que era uma pontinha de inveja não me perturbava e nem aos demais. Afinal de contas, apenas os meus pensamentos é que davam vasão a ele.
Sempre que alguém querido ou conhecido fazia algo de valor, lá estava eu a pensar: “pra ele é fácil, tem tudo na vida”... ou então, “é muito fácil, pois ele tem muita sorte...ou tem os mentores espirituais ao seu lado”... Sempre julgava sem conhecer.
Era antes um pequeno sentimento, mas aos poucos foi crescendo, passou do tamanho de um vírus para uma bactéria e então, não eram mais apenas meus pensamentos que estavam demonstrando aquela inveja crescente.
Caso alguém fosse olhado com admiração, ou conseguisse conquistar pelos próprios esforços um prêmio, uma bolsa de estudo, um trabalho ou um cargo melhor, fosse um companheiro afável, lá estava eu sempre a pensar que poderia ser eu! Não apenas reclamava, mas desejava estar no lugar do outro, contudo, sem os mesmos sacrifícios.
Do tamanho de uma bactéria, passou ao grão de areia... Nesta fase, a situação se agravou perceptivelmente. Eu, espírita de carteirinha, “de banco” nas palestras e estudos, médium, trabalhador, palestrante e outros tantos títulos acumulados estava ali sempre observando meus confrades. Dentro do coração a inveja só ia crescendo e ia desde o mais humilde trabalhador da casa ao presidente.
Muitos foram meus pensamentos invigilantes... Pobre de mim! Mais do que isso, começaram os comentários infelizes com aqueles que estão sempre de ouvidos prontos para ouvir qualquer fofoca ao pé do ouvido.
Para o trabalhador mais humilde dizia: “É fácil! Ele não tem maiores responsabilidades na casa. Basta sentar, esperar, aparecer aqui e ali e pronto! Todos o amam e lhe querem bem... não tem grandes responsabilidades.”
Para os médiuns... Ah, era uma chuva de pensamentos e comentários desgovernados! Aos doutrinadores, o trabalho deles era muito fácil, não precisavam da concentração que os psicofônicos necessitavam, era só ler e saber conversar sobre as obras básicas... Aos psicofônicos... Mais fácil ainda, só abrir a sintonia e pronto... Pra tudo dava-se um jeito... Aos curadores, era só impor as mãos, aplicar tratamentos, injeções, conversar um pouquinho.
Aos evangelizadores... Fácil demais cuidar das crianças... Aos jovens... Muito bom ser jovem, não ter preocupações de adultos, viver às custas dos pais... Aos que só apareciam para ouvir e tomar passes nem se pode falar aqui o que eu pensava.
Para os dirigentes e ao presidente... Aí o grão de areia já crescia, e a inveja se tornava um balão cheio... Talvez seria agora mais um despeito, uma inveja ainda maior do que o “normal”... Achava que o poder em mãos era a melhor coisa! Poder controlar uma casa espírita, um trabalho... Enfim...
A minha doença foi avançando pouco a pouco, fase a fase... Ano a ano! E no fim da vida não havia um ser vivente que não era invejado por mim, exceto eu mesmo! Eu que era o despeito e a inveja em pessoa! Língua ferina, orgulho ferido, inveja inflada!
Adquiri inúmeras doenças físicas decorrentes destas doenças morais! Gastrite, gota, cefaleia, insuficiência renal... Por fim, o tão temido câncer que se manifestou no músculo cardíaco... Contudo, consegui o transplante depois de longa agonia, preces e promessas que iria mudar.
Deus, em sua misericórdia me ouviu e deu-me uma nova oportunidade! Quantas bênçãos! Pareci realmente humilde depois da quase morte do meu corpo físico e até achei que nunca mais cairia no mesmo erro.
Ledo engano! Bastou readquirir as mesmas forças físicas, os mesmos cargos, destaques e responsabilidades e o balão que havia murchado, voltou a se encher... E para meu bem, o Senhor deu-me novo momento de reflexão: um AVC que provocou ainda insuficiência na oxigenação do cérebro comprometendo os órgãos da fala e da visão!
Deus foi tão generoso que retirou a minha possibilidade de enxergar quando eu só conseguia ver com os olhos da inveja, e tirou-me a possibilidade de falar para ao menos não expressar a inveja e o orgulho de meu coração. Só não pode retirar a revolta que me atingiu... É... Meus amigos e irmãos... Mesmo assim, vivi mais alguns anos que atenuaram meus sofrimentos do lado de cá. Os prejudicados por minha inveja e língua ferina, além dos pensamentos causticantes? Inúmeros!
Fui recolhido, mas minhas vibrações desgovernadas me levaram de volta à Terra material, depois às regiões de sofrimento para que, só anos depois... Após imensas dores morais e físicas, reconheci os erros, pedi perdão e hoje aqui estou, desde os últimos meses sendo atendido por esta casa irmã que me oferece o teto e o pão do espírito!
Um dia sei que vou melhorar e deverei não só me arrepender, mas recomeçar. Tenho medo, pois sei que quando voltar a ter condições normais de vida, estarei enfraquecido devido aos vícios que carrego no espírito imortal.
Rezem por mim, meus amigos! E por todos aqueles que acreditam que apenas os pequenos pensamentos, as pontinhas de inveja que surgem dentro de nós, não são de nada... Obrigado pela oportunidade! Deus abençoe a todos!
Oswaldo Alcântara – 18.09.12

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