As Mãos de Riley
Numa noite gélida de um país
europeu. Tomas Riley andava perambulando pelas ruas, encolhido no seu casaco
que apenas amenizava o frio que sentia. Não estava nevando. Mas havia esfriado
o suficiente naquele outono para que poucas pessoas se arriscassem a sair pelas
ruas depois de certa hora da noite.
Aqueles que buscavam as ruas
geralmente logo entravam em algum bar ou iam para suas casas e ou de amigos...
Havia também aqueles que não tinham outra opção a não ser de ficarem nas ruas.
Eram os abandonados da sociedade, os que haviam perdido tudo: família, amigos,
destaque social, eram simplesmente rejeitados e ignorados pela maioria dos
demais.
Não era o caso de Riley, um
músico e poeta de certo renome, muito bem quisto e requisitado em sua
profissão. Aquela cena não acontecia por acaso, não era a primeira vez que
Tomas saía às ruas assim, sozinho, segurando apenas seu instrumento musical e
nos bolsos possuía algumas moedas e cédulas.
Pensava com ele mesmo que havia sido egoísta, pois deveria ter trazido
mais agasalhos, não para se proteger do frio, mas para oferecer aos
companheiros daquela noite gélida.
Como todos que estão nas ruas
em dias assim, Riley, procurava locais em que o vento frio tivesse alguma
dificuldade de penetrar. Que fossem mais escondidos, tipo marquises e becos...
Com certeza não era algo muito seguro, mas ele não se importava muito. Deixava
que suas intuições o levassem. Era um homem de muita fé que elevava seus
pensamentos ao Criador para que Este o conduzisse à direção certa.
Embora tivesse muita fé, não
era partidário de nenhuma religião, apenas tinha fé em Deus e na bondade das
pessoas. Foi assim que o músico virou num beco mais ou menos iluminado, o seu
anjo guardião que o acompanhava sempre o inspirando, praticamente o “empurrou”
para aquele local, naquela noite. Lá chegando escutou alguns gemidos e viu
sombras encolhendo e tentando se esconder dele que era um estranho adentrando
na escuridão. Percebendo as sensações que causara com sua entrada repentina,
Riley parou os passos e da forma mais discreta possível retirou seu violino,
preparando para tocá-lo sem nada dizer.
Suave e lindamente ele
conduziu notas que diziam muito sobre seu sentimento de solidariedade por todos
ali e seu amor. Aos poucos aquelas sombras foram relaxando e se aproximando do
anônimo músico que ali havia aparecido para brindá-los com o pão do espírito.
As vibrações musicais inundaram o ambiente. Do outro plano da vida, uma legião
de bons espíritos se aproximaram, eram os mentores e anjos daquelas criaturas
das ruas que estavam desesperançosas com suas existências...
Tomas tocou por cerca de uma
hora sem parar, com tanta emoção, empenho, amor, que sentira ser a melhor
apresentação de sua existência. O que para nós deste lado da vida não fora uma
surpresa, pois seu anjo guardião, como depois verificamos, era também um músico
neste plano. A sintonia entre anjo e tutelado atingiu quase que a perfeição!
Após a performance, o músico
sorriu e sentou-se à frente de seus “anfitriões” e começou a conversar como se
estivesse vivendo ali há muito tempo. Cumprimentou a cada um dos cerca de oito
membros, pois que além da família composta por pai, mãe e filha, juntara-se
mais outros companheiros das ruas. Conversaram como velhos amigos por horas e
horas. Riley ainda tocou mais outras músicas vez ou outra a pedido daqueles
irmãos.
Deixou que todos pudessem
manusear aquele instrumento que muitos nem mesmo conheciam ou só tinham ouvido
falar, mas nunca havia escutado. Levou uma palavra de consolo. Deu atenção,
distribuiu o pouco dinheiro que possuía para que pudessem ao menos comprar algo
de comer ou algum cobertor, ofereceu o seu agasalho para a garotinha se
aquecer, ficando apenas com sua camiseta. O sapato, deu ao pai que calçava o
mesmo número. Lá pelo meio da madrugada, quando o rapaz voltou com um lanche
para todos, os moradores das ruas acenderam uma pequena fogueira improvisada
para todos se aquecerem e continuarem a conversa.
Para a surpresa de Riley,
quando o lanche foi distribuído, os novos amigos repartiram em pedaços iguais
oferecendo também à ele que tinha o que comer em casa. E por mais que ele
dissesse que não estava com fome e depois comeria em casa, teve que ceder pois
seria uma desonra não aceitar. Todos conversaram até alta madrugada quando o
sono bateu. Os novos amigos de Tomas pediram uma última música, no que ele
atendeu com alegria, apesar do frio que sentia no corpo, seu coração ardia em
chamas de alegria pela bela noite que passara.
Nosso amigo se despediu de
cada um com um abraço e a promessa de voltar sempre que possível. E assim foi.
Todas as vezes que não estava viajando, trabalhando, Riley voltava ali ou em
outros locais para ajudar os carentes do mundo. Para levar um pouco do consolo
da arte que poucos tem oportunidade de ter o contato. Eram noites em claro que abasteciam-no
de forças para as lutas do dia a dia!
Tomas auxiliou a tirar vários
das ruas, inclusive aquela família de pai, mãe e a garotinha. Era um trabalho
solitário e sem alarde. Nunca se vangloriou do que fazia. No fim da vida, estava
doente e sozinho, pois sempre tivera poucos parentes na vida, e todos já haviam
ido para o outro mundo à sua frente. Como não se casara, só tinha os poucos
amigos da sociedade que não entendiam o seu jeito de ser. De preferir os pobres
a eles...
Embora assim, fosse, era
admirado como músico e no seu velório, a maioria dos que lá foram, eram os
antigos amigos das ruas. Alguns que ainda erravam por elas, outros tantos que
haviam saído graças às mãos estendidas de Riley...
Ao lado do corpo, amparado
por seu anjo guardião. Quando estava mais consciente de sua situação de
desencarnado, percebe então uma surpresa. Diversos espíritos músicos e muitas
crianças e jovens sorridentes vinham em coro e orquestra prestar uma homenagem
de boas vindas a Tomas Riley por tudo o que ele fizera no mundo. Foi lindo de
se ver! Riley emocionado chorava de alegria e gratidão. E fez questão de
abraçar e agradecer a cada um para só depois deixar-se conduzir pelo seu anjo
ao reino dos céus! Na Terra, como último ato de bondade, deixou sua casa e
todos os seus bens para uma instituição religiosa que atendia os homens,
mulheres e crianças que viviam sem um lar...
Jesair Pedinte – 02.05.15,
psicografado por Jerônimo Marques.
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